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ColunaNDH | Artigo: Violência Legislativa

On 06/17/24 15:24 . Updated at 07/31/24 09:54 .

Artigo escrito por Bruna Junqueira e Heitor Caetano, publicado no Jornal O Popular no dia 14 de Junho de 2024

Autoria: Bruna Junqueira e Haroldo

Com a ascensão da extrema-direita no ambiente político, vêm se tornando banais iniciativas que criminalizam populações marginalizadas ou que retiram direitos conquistados no processo de redemocratização do país. A guerra imaginária do nós contra eles, estratégia dos que se alimentam do discurso da violência, é também distorcida dentro de dogmas religiosos por políticos que se escondem atrás do púlpito. Direito e religião se confundem para assim produzir uma sociedade pautada pelo autoritarismo e pelas verdades de doutrinas carregadas de ódio e preconceitos de todos os matizes.

A violência contra as populações periféricas, fundada no racismo estruturante da nossa sociedade, já não é suficiente para sustentar os discursos dos homens ávidos pelo poder a qualquer custo em busca de sua sociedade imaginada. Se o controle da polícia pela sociedade deu lugar ao controle da sociedade pela polícia, chegou o momento de restringir um pouco mais os movimentos democráticos. Os tapas na cara de pretos e pobres, os falsos confrontos mal-simulados, a máxima militarização dos presídios, são práticas que se tornaram norma na política dos casos isolados. Então, é hora de avançar para o controle absoluto descrito nas mais absurdas distopias, como nas obras de Yevgeni Zamiatin, George Orwell ou Margaret Atwood.

O alvo do momento são as mulheres. Na Gilead desejada pela extrema-direita, o corpo masculino é privado, enquanto os corpos femininos são públicos. Com os seus úteros expostos a vigilância total de um implacável big brother. Eis que os extremistas querem criminalizar o aborto em qualquer situação, impondo às mulheres mais sofrimento do que o da própria gravidez indesejada e (aqui uma situação digna das telas de Edvard Munch) querem a prisão por até 20 anos da mulher que pratica o aborto mesmo quando a gravidez resulta de estupro.

A emancipação da mulher seria consequência natural no regime democrático e levaria a uma sociedade mais justa. Se homens e mulheres têm direitos iguais, o que a mulher faz do próprio corpo só a ela compete e interessa. Contudo, a despeito da promessa civilizatória da Constituição, a violência legislativa contra a mulher tornou-se prática corriqueira em ataques que poderiam ser comparados a crimes contra as mulheres e contra a democracia. O legislador não pode fazer da lei instrumento da prática de violência. Além do mais, a iniciativa desrespeita o principio da vedação do retrocesso em matéria de direltos humanos.

Não bastasse a rotina insuportável de crimes contra as mulheres, espancadas, mutiladas e mortas, na maioria das vezes por seus próprios companheiros, o Estado idealizado pela extrema-direita pretende fazer sucumbir a dignidade de meninas e mulheres nesse ataque que lhes retira a condição de seres humanos. É preciso anunciar aos gritos: não é válido equiparar o aborto a homicídio, sendo descabido o retrocesso na lei que regula os casos de aborto legal. Isso chega a ser cruel e acintoso. Cabe à parte democrática da sociedade brasileira uma reação vigorosa em defesa das mulheres diante dessa agressão ignominiosa.


Não ao PL1.904/2024!

Source: Jornal O Popular

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